Reflexões Inquietas

O papel das pandemias em grandes momentos históricos


O texto fala das pandemias, tema desenvolvido quando da reclusão familiar dos brasileiros na Covid, em artigo publicado em 2021 na Revista Transdisciplinar, um periódico criado e organizado pela psicóloga baiana Maria Celeste Carneiro dos Santos.
Uma observação de fenômenos excepcionais que vêm ocorrendo no mundo apontou para o advento da pandemia da Covid 19, a partir de 2020, a maior em cem anos contados desde a Gripe Espanhola de 1918. O curioso nos dois casos de crises sanitárias foi seu advento praticamente como sequência de dois momentos graves da História: a 1ª. Guerra Mundial de 1914/1918 e a Crise Econômica Mundial iniciada em 2007/2008.
A pergunta lógica era: O que ocasiona o advento de uma doença tão letal? Quais as suas conexões com a política e com a guerra? Este texto lança um olhar para os dois casos, mas só depois de mencionar outros três: dois deles, Atenas e Roma, ocorridos na Antiguidade Clássica, e mais um, a Peste Negra, na Idade Média.
Os casos de Atenas e Roma parecem correlacionar as pestes a eventos catastróficos. Seja a Guerra do Peloponeso, seja o período conflituoso que antecedeu a queda de Roma, ambos apontaram para a fome e a miséria como vetores para o advento de epidemias que mudaram o curso da História.
Pode parecer que a Peste Negra seguiu um curso inverso, já que a intensidade com que atingiu a Europa praticamente afetou todas as instituições que a fundamentavam: demografia, cultura, religião, Estado. Nada lhe escapou. Seu surgimento na Ásia Central, porém, deve ter refletido as condições de vida em que viviam seus povos.
O surto de influenza ao final da Grande Guerra também não surpreende a qualquer observador qualificado, porque após uma guerra feroz, de aglomeração desmedida em trincheiras imundas, ela acompanhou os soldados desmobilizados, em sua volta para casa.
A Covid 19 parece ser apenas mais um caso recorrente da estupidez humana. A crise econômica global iniciada em 2007 explicitou os substanciais desequilíbrios financeiros que aprofundam o fosso entre os ricos e os miseráveis. Essa crescente consciência de que algo vai mal no reino do neoliberalismo se torna cada vez mais palpável à medida em que as elites estéreis de plantão tentam, quase desesperadamente, impor as mesmas políticas destrutivas de que sempre se utilizaram no passado. O importante é que, talvez, os enormes avanços científicos da era contemporânea nos livrem dos números astronômicos das epidemias do passado. Talvez não, ao menos em regiões negacionistas do Planeta, porque, ao contrário de todo senso, ao avanço tecnológico não se seguiu uma evolução nas mentes. Muitos indivíduos ainda se submetem às superstições do passado e se recusam a tomar as vacinas, única rota de saída.

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10 respostas

  1. Livro e tema que recomendo: “A Ordem do Capital” – Clara Mattel ”

    Por mais de um século, diferentes países e governos enfrentaram crises financeiras ao aplicar cortes em políticas públicas e precarizar as relações de trabalho. Embora tenham sido bem-sucedidos em acalmar os credores e o mercado, os efeitos no bem-estar social e econômico da classe trabalhadora foram devastadores. Em tempos de crises e incertezas, a austeridade continua sendo praticada em todo o globo. A ordem do capital, de Clara Mattei, é um estudo profundo e interdisciplinar sobre a relação entre austeridade e ascensão do fascismo.

    Voltando ao início do século XX, a economista traça as origens da austeridade no entreguerras na Grã-Bretanha e na Itália, revelando como a autonomia da classe trabalhadora nos anos pós-Primeira Guerra Mundial incentivaram um conjunto de políticas econômicas de cima para baixo que sufocou os trabalhadores e impôs uma hierarquia ainda mais rígida em suas sociedades. Foi quando a austeridade revelou seu principal objetivo, a proteção do capital e a eliminação de todas as alternativas ao sistema capitalista, e foi nesse contexto que a política econômica funcionou como aliada ao fortalecimento do fascismo.

    Considerado pelo Financial Times um dos melhores livros de 2022 e por Thomas Piketty como “leitura obrigatória, com importantes lições para o futuro”, A ordem do capital, com sua base teórica sólida e fontes históricas e arquivísticas originais, oferece um novo olhar sobre a história da austeridade, intrinsicamente conectada com a economia moderna e com o poder político contemporâneo.

    1. Obrigado, Carlos, pela excelente sugestão. Vamos ler A Ordem do Capital; austeridade vs fascismo.
      A economista italiana Clara Mattei fez um trabalho importante ao associar as políticas de austeridade com projetos políticos autoritários.
      Os estudos dela são muito atuais, porque estamos neste momento discutindo a viabilidade e oportunidade e tributar os mais ricos. E os mais ricos resistem a abrir mão de uma parte ínfima de seus privilégios.
      Nada de novo sob o sol. O furor neoliberal que domina o ambiente vê com bons olhos a enorme e crescente desigualdade de renda. Nem se dá conta
      (ou não se importa) do desconforto, ansiedade e até mesmo medo que as camadas de renda mais baixa sentem com relação a um mundo que parece querer fugir do controle dos governos ainda democráticos.
      Grande abraço,
      Luiz Afonso

    2. Caro Carlos,
      Por não saber ainda como fazer um comentário adicional, aprovei pela segunda vez seus últimos comentários.
      Você falou do excelente livro da Clara Mattei,
      Lembrei-me depois que outra italiana, Mariana Mazzucato, também fez uma boa entrevista na Folha dia 2 de outubro.]Ela falava que é preciso reinventar o capitalismo e voltar a destacar a importância fundamental do Estado.
      Ou seja, menos conversa acerca de privatização e mais intervenção positiva.
      Aliás, a atuação da ENEL está sendo muito criticada depois do ciclone de sexta. O que dizer, então, da pressa em privatizar a Sabesp?
      Creio que Clara Mattei e Mariana Mazzucato devem trabalhar junto ou estão com seus pensamentos muito afinados.
      O prêmio Nobel Stiglitz também joga nesse campo. Olho neles!

  2. A neo/reindustrialização, com foco no hidrogênio verde – H2V – será a chave e já está em andamento. Senão corremos o risco de , via exportação, reindustrializaremos os OUTROS.

    1. Cara Lenina, obrigado por mandar a indicação de um livro acerca de pandemias que parece ser bem completo

  3. Luiz.
    Ótimo texto de estreia.
    Entretanto, só pra contrariar, acuso três fatos: o surgimento de uma nova potência econômica que tirou cerca de 700 milhões da pobreza, o surgimento do AGRO brasileiro e a criação de uma rede segurança social no Brasil.

    1. gostei de seus comentários, Carlos.
      China será tema central, até por sus centralidade no BRICS. Agronegócio é o caminho ou devemos priorizar a reindustrialização? A questão social deve ser a prioridade um.

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