Reflexões Inquietas

OS ORGANISMOS FINANCEIROS INTERNACIONAIS E O G-20

Esta nota pretende abordar algumas das questões que foram discutidas no encontro de Ministros da Fazenda e Presidentes de Bancos Centrais do G-20, que ocorreu em julho de 2024 no Rio de Janeiro. Por conta da própria natureza do atual governo do país, há um esforço para levar para os foros internacionais a questão do combate à pobreza. Grandes temas emergem: tributação dos super-ricos, maior poder de voto nos Organismos Financeiros Internacionais para os países em desenvolvimento e centralidade no combate ao aquecimento do planeta. Finalizada a reunião, foram emitidos inúmeros documentos que serão encaminhados aos respectivos Chefes de Estado para a Cúpula que ocorrerá em novembro de 2024, na mesma cidade do Rio de Janeiro.

O Communiqué da reunião destacou os desafios globais de longo prazo, que continuam a requerer colaboração multilateral e ação decisiva. A lista de temas é extensa e passa por combate à pobreza e fome, doenças, desigualdade de renda, insuficiência no acesso a tecnologias, qualidade educacional, insegurança energética, necessidade de investimentos sociais, elevada carga de dívida e mudança climática, dentre outros

Os organismos financeiros internacionais, Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial, foram fundados em 1944, no Acordo de Bretton Woods, com o intuito de operacionalizar a nova ordem econômica mundial para a pós- 2ª. Guerra Mundial. Sua atuação foi decisiva por vários anos na prevenção de crises financeiras e apoio à industrialização das nações menos desenvolvidas. Desde o início dos anos 1980, porém, sua importância vem decaindo por conta de um intenso processo de desregulamentação econômica, associado ao que se convencionou chamar de neoliberalismo.

Hoje, oitenta anos passados desde o início de suas existências, a pergunta que se faz é: pode-se esperar que essas instituições tenham a capacidade de enfrentar os desafios do século XXI? É possível fazê-lo num mundo multipolar que se caracteriza por fragmentação e desencontros, ódios e espírito bélico? Considerando-se a enorme massa de recursos destinada às guerras da Ucrânia e Gaza, há disponibilidade de recursos para uma reação benigna no campo econômico e social, particularmente nas mudanças climáticas e no combate à pobreza, que inclua tributação dos super-ricos?

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4 respostas

  1. Sou completamente leiga no assunto, mas a natureza das questões que foram discutidas no encontro dos Ministros da Fazenda e Diretores dos Bancos Centrais do G 20, gera alguma esperança de que sejam abordadas e quiçá encaminhadas na reunião que ocorrerá entre os Chefes de Estado, em novembro deste ano. Compartilho da compreensão que os Organismos Regionais serão os protagonistas da viabilização.

    1. Há muito tempo os organismos financeiros internacionais, FMI,OMC e Banco Mundial, abriram mão de serem influentes no apoio às necessidades financeiras e de desenvolvimento dos países e média e baixa renda.
      A Secretária do Tesouro do Governo Biden, Janet Yellen, já desafiou estas instituições a se preparar para enfrentar os desafios do século XXI: novas pandemias, ameaças ambientais e pobreza crescente.
      O Governo Biden fez alguns programas internos significativos que implicam aumento da intervenção pública, ao contrário da cartilha neoliberal. Veremos como Kamala se sairá, se vencer Trump.
      Yellen esteve no G20 no Rio de Janeiro em julho. Em conversa com Haddad, deu apoio à ideia de tributar os super-ricos, mas julgou desnecessário que isso derive de um programa global dos governos. Um “beijo de morte” na ideia?
      Nos tempos que correm, a necessidade global de recursos para o desenvolvimento se divide em: pouco mais de 70% provém de fontes bilaterais e regionais e pouco menos de 30% de fonte multilaterais (ver este texto e o anterior, que fala de “trindades impossíveis”).
      Acho que você tem razão. Parece mais razoável pensar que a solução dos problemas de pobreza e desenvolvimento deve ser buscada em cada país e em acordos de instituições regionais, aí incluído o BRICS, que não é “regional”.

  2. Sublinho que o artigo se concentra no esforço de técnicos de organismos internacionais, como em tantos outros momentos, desde o pós Segunda Guerra.
    Entretanto, sinto que uma grande dificuldade na orientação de mecanismos de financiamento para os países de baixa renda se situa na precarissima estrutura de governança para absorve-los., a saber a ausência de um conjunto de lideranças perenes no seio da classe política. Parece algo como a renegociação das dívidas de Estados e Municípios no Brasil.

    No caso dos países de renda média, o quadro acima citado muda bastante, com grande número deles razoavelmente articulado com o novo e ampliado fluxo de comércio derivado do processo de globalização puxado pelo leste da Ásia.

    Para esse caso, vejo uma efetiva presença de capitais privados captados no mercado financeiro internacional e de investimentos diretos de multinacionais em telecomunicações, energia renovável e matérias primas estratégicas, com menor presença dos organismos tradicionais.
    Novidade, a criação do BRICS pode mitigar eventual restrição de financiamentos oficiais.
    Registro que a insatisfação com a atuação dos organismos citados não deve desmerecer , pelo contrário, o esforço da construção da pauta para Belém, em novembro, e que a ousadia da proposta de tributação de fortunas pode ser substituída por apoio voluntário na área de energias renováveis e preservação do meio ambiente, a semelhança do FUNDO AMAZÔNIA.

    1. Caro amigo,
      Ainda que afastado das discussões dos organismos internacionais desde minha aposentadoria, tenho a tendência de concordar com sua afirmação de que os países de baixa renda têm pouca capacidade de absorver financiamentos para o desenvolvimento.
      Lembro-me de uma reunião da Associação Internacional de Desenvolvimento (IDA, na sigla em inglês), o braço concessional do Banco Mundial, isto é, aquele que se volta para os países mais pobres e faz empréstimos em condições subsidiadas.
      Falava-se, então, do desperdício que foi mandar uma máquina sofisticada, que aumentaria muito a produtividade do trabalho, para um país pobre. A mão-de-obra local não tinha capacidade de operar essa máquina. Surgiu, porém, o argumento de que havia uma máquina muito mais simples, acho que tinha sido produzida pela EMBRAPA, que também aumentava a produtividade do trabalho. Nada que se comparasse àquela outra, é claro. Ela tinha sido muito bem vinda ao país de que falávamos, porque sua operacionalização era simples. Você, obviamente, já entendeu onde quero chegar: é preciso sempre levar em conta o grau de desenvolvimento tecnológico local para conseguir avanços concretos.
      Sou muito cético com relação ao papel do setor privado. Também concordo com você que o setor privado pode ser fundamental em países de renda média, como são os casos que você citou: telecomunicações e energia renovável, dentre outros.
      Acho, no entanto, que mais do que os países avançados, há países de renda média que podem contribuir muito com os de baixa renda.
      Foi o caso da tal máquina agrícola, que estava a poucos passos além do velho arado manual. O fato de o atraso nos processos agrícolas ainda estar presente na mente dos dirigentes dos países médios, talvez faça com que eles se preocupem com esforços de melhora gradual, que possam ser assimilados mais facilmente.
      Enfim, organizações regionais podem, eventualmente, ser mais eficazes que organizações multilaterais dominadas por países ricos. Os países do BRICS podem estar incluídos dentre esses organismos regionais.
      Aproveitando seu comentário, vou me permitir introduzir uma questão em que eu acho que “comi mosca”. Na pg. 6 do texto, terceiro parágrafo, 7a. linha, falei que a introdução ao 1º pilar da OCDE dependia de adesão de “massa crítica de jurisdições”. Isso, certamente, ficou meio obscuro. No mesmo dia em que postei o texto, Paolo Gentiloni, Comissário da União Europeia para Assuntos Econômicos, deu uma entrevista para a Folha de São Paulo (caderno Mercado, 04.08.2024:4). Ele disse que essa questão da jurisdição tem a ver com o desenvolvimento de um mecanismo que possibilite que as multinacionais paguem seus impostos onde estão fazendo negócios e não onde têm suas sedes, o que tem sido chamado de “realocação dos direitos de tributação”.
      Abraços, amigo, obrigado pelos comentários.

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